PM dentro, PM fora, mas que PM?

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Esse é um assunto delicado. Na internet (jornais, facebook, etc.) vem informação de tudo quanto é tipo. É comum ter "... eu estive lá. Eu vi. A PM foi brutal...". Mas também tem: "... eu estive lá. Eu vi. A PM agiu normalmente...". Não adianta. A verdade é sempre relativa e depende de quem testemunha o fato. É natural haver tendenciosidades que, em situações limítrofes, resultam em opiniões a favor de um lado, ou de outro. Por isso não pretendia escrever nada aqui sobre o que ocorreu. A minha opinião acabaria sendo interpretada como radical para uns, sensata para outros. Mas, um post no facebook me motivou. Começa assim: "Em Havrd, Princeton, Cambridge… Universidad de Buenos Aires… Universidad de Chile… UFMG, UFF, UNB…. Nenhuma delas a polícia está autorizada a fazer a segurança interna...". Espera um pouco! Eu já estive em muitas universidades no exterior e muitas têm polícia armada sim. Então eu fui checar...

Em Harvard: "What's the difference between the HUPD and the city police, like Cambridge, Boston Police, etc.? The only difference is jurisdiction. HUPD officers are licensed special State Police officers and deputy sheriffs in both Middlesex and Suffolk Counties. Those powers give them the authority to respond to any crime on our campus and any "breach of the peace" on city streets in Cambridge, Somerville, and Boston. Officers receive the same academy training as officers from Cambridge."

Em Princeton: "The department consists of 62 professional police officers, security officers and other team members dedicated to providing first-class services to the University community. Officers patrol the campus on foot, bicycle, and in vehicles. The Department of Public Safety officers together with a supervisory staff of police patrol sergeants, lieutenants and a captain are on duty 24 hours a day."

Na Universidade de Berkeley, na California: "The Berkeley campus has a dedicated, full- service police department with 64 officers, 45 full-time civilian personnel, and 60 student employees. UCPD, located at 1 Sproul Hall, has primary law enforcement jurisdiction on the campus of the University of California and associated University properties. The department is empowered as a full- service state law enforcement agency pursuant to section 830.2 (b) of the California Penal Code and fully subscribes to the standards of the California Commission on Peace Officer Standards and Training (POST). Officers receive the same basic training as city and county peace officers throughout the state, plus additional training to meet the unique needs of a campus environment."

É um post longo. Desculpem-me...

Em muitos campi universitários (citei três das maiores universidades dos EUA, mas presenciei isso em muitas outras), a segurança é feita pela polícia sim (na totalidade ou em parte). Mas é uma polícia especialmente treinada. Não é guarda universitária. Não é segurança particular. É polícia! Vão aparecer aqueles que vão dizer: "isso é questão de semântica...". Não é minha interpretação, já que nesses lugares a "guarda" recebe formação de policial e depois, treinamento especializado para lidar com o público universitário. Além de seguir regulamento policial igual aos das cidades que estão localizadas.

Isso quer dizer que, então, a PM deve fazer a segurança do campus da USP? Sim... e não. Sim, acredito que devemos ter a polícia no nosso campus. A polícia de hoje é bem diferente da polícia de 1968. Ela tem muitos elementos de corrupção, muito despreparo. Não é perfeita. Mas não é ideológica. Está longe disso. Eu posso falar qualquer asneira em qualquer lugar da USP. Se não for uma asneira classificada como crime (por exemplo, racista) a PM não vai me fazer nada. Vejam só a quantidade de opiniões antigovernistas e ideológicas espalhadas pela internet. Você vê as pessoas que escrevem esses textos desaparecendo do dia para a noite?

Não quero dizer que a nossa PM, como ela é hoje, é o corpo policial ideal para a USP. Está longe disso. Nossa PM é treinada para enfrentar bandido de alto risco. É preciso polícia especializada, treinada para lidar com as situações diferenciadas que encontramos nos campi universitários. É um ambiente diferente, mais rebelde mesmo. Essa rebeldia é importante porque fomenta novas ideias, mudanças na sociedade. Ela deve ser estimulada, valorizada e desejada. A polícia tem que ser treinada para entender essa rebeldia e respeitá-la. O que não pode é, com justificativa nessa rebeldia, cometer crimes.

Para terminar, como isso tudo começou? Com a PM abordando três alunos que fumavam maconha. Eu não sei se ela foi truculenta, ou não, na abordagem. Quase todos relatos que li, sugerem que não. Porém, houve uma resposta de um grupo de alunos que foi bastante truculenta e isso acabou gerando confusão. Depois houve a invasão da reitoria, também truculenta (sem falar em desrespeitosa com a decisão de uma assembléia). Por outro lado, hoje os alunos marcharam pacificamente em uma passeata no centro de São Paulo. Cerca de 600 pessoas iniciaram e, em algum momento, li por ai, o movimento chegou a alguns milhares. Com a PM do lado, pacificamente, sem repressão ideológica. A minha geração clamou pelas eleições diretas e impugnou um presidente dessa forma. Se isso tivesse sido a primeira resposta dos alunos à abordagem inicial da PM, tenho certeza que a opinião pública seria mais simpática. Não digo que a maioria apoiaria os estudantes. Mas não seria como está agora, totalmente contra.

Fica a dica: A violência é uma ferramenta válida em tempos de ditadura. Em tempos de democracia, a melhor arma é a palavra.
Alexandre Thursday 10 November 2011 at 8:04 pm | | Default

fourteen comments

Pedro R. Almeida

Sou aluno do bach. no IFUSP, acho que você não me conhece, mas gostaria de dizer que gostei muito deste texto. Sou dos que achou sensato e, apesar de já compartilhar de boa parte das opiniões, foi um dos poucos textos que li sobre o assuno (e eu tenho lido muitos) com opiniões relevantes e diferentes. Mandou bem!

(:

Pedro R. Almeida, - 10-11-’11 21:43
Marcio

http://raquelrolnik.wordpress.com/2011/1..

Marcio, - 10-11-’11 23:08
Fábio C. da Silva

Oi, primeiramente quero congratulá-lo pelo texto bem escrito e bem articulado, sou estudante do IFUSP já faz alguns anos e tenho acompanhado, o mais perto possível, das manifestações ocorridas na USP pelos estudantes. Estou com o curso atualmente trancado e acompanhei de longe, mas sempre procurando ler as diferentes opiniões de ambos os lados pra formar um julgamento dos fatos e idéias, o mais justo , de acordo com minha visão ideológica.

Achei seu texto, dos que eu li até agora, a favor de uma real polícia no campus, o único com argumentos bem construidos e por incrível que pareça, vai de acordo, em algumas partes, com um outro texto de um outro professor da USP, da EACH, que é contra a polícia militar, pelo menos como ela é hoje, dentro do campus, pois na EACH não deu certo, ou seja, já houve uma experiência que não deu certo, insistir nisso seria muita burrice por parte do reitor.

Eu sou a favor de uma reciclagem da Guarda Universitária, pois ainda prefiro que a universidade tenha autonomia também na segurança, mas sou contra a arma-la, pelo menos não com armas letais, pode até usar as armas não letais, mas acima de tudo, mudar no regimento da universidade ( que o último reitor mudou pelo menos 3 ou 4 vezes entre esse e o ano passado pra ampliar o poder do próprio) para, ao invés de proteger os bens móveis e imóveis da universidade, inclua a proteção da comunidade acadêmica, pois foi isso que eu vi em comum nas universidades que você citou.
Desculpe pelo comentário muito longo.
Abraços

Fábio C. da Silva, - 11-11-’11 00:36
Mariana

Oi Alexandre! Vc pode ser que saiba que eu não estou aí no Brasil acompanhando essa coisa de perto, mas no campo das idéias sempre fui contra a presença da polícia militar, como tal, no campus. Quando discuti esse assunto aqui na Alemanha, as pessoas ficaram um tanto quanto chocadas que a polícia militar estivesse envolvida (sabe, aqui com o trauma imenso do nazismo se vc é maluco de acionar uma força federal pra algo civil e local, todo mundo te crucifica). E aí eles me fizeram uma pergunta que eu não soube responder, mas talvez vc saiba: porque a USP não tem algo como nos moldes de Harvard e etc., mas envolvendo essencialmente a polícia civíl (claro, treinada especialmente pra universidade)? Não seria isso o justo a se fazer? Ou no Brasil essa divisão é diferente?

Até logo!!

Mariana, - 11-11-’11 13:30
Alexandre Suaide

Oi Mariana
Tem um detalhe. Em geral, a polícia militar, no exterior, tem um contexto totalmente diferente da do Brasil. Apesar da brasileira ser militar ela é treinada para ações no ambiente civil, ao contrário da polícia militar nos outros países que, em geral, são usadas somente em casos onde as forças armadas são convocadas explicitamente. No Brasil, a polícia militar tem uma função preventiva, zelando pela ordem pública enquanto a polícia civil tem função investigativa. Na verdade, os nomes são totalmente inapropriados (têm origem histórica) e poderiam ser mudados. Há quem defenda isso para acabar com esse estigma. O análogo, nos EUA, é PM = police officer, PC = detective.

Alexandre Suaide, - 11-11-’11 13:52
Mariana

Pois é, desconfiava que a coisa era diferente mesmo.

Mariana, - 11-11-’11 15:04
Mariana

Obrigada!

Mariana, - 11-11-’11 15:04
Pedro

Prof. muito bom o texto, uma dica, acredito que esta faltando um botão para compartilhar no facebook, isso iria contribuir muito para o alcance dos posts.

Pedro, - 11-11-’11 16:44
Valdir

Oi Alexandre,

É o Valdir do DFGE, tudo bem? Parabéns pelo texto, e obrigado pelas informações sobre como ocorre o policiamento em outras universidades. Mas os problemas da USP, e que de uma hora para outra fazem com que um estopim chegue ao seu fim, está na forma como são tratadas as questões internas e na estrutura desigual de decisões por parte das direções (Reitor, COs, etc…), pois a representação dos vários segmentos que compõem nossa universidade (alunos, docentes e funcionários) hoje, ainda não é contemplada.
Acho mesmo que talvez as coisas na USP, com o auxílio da imprensa paulista, estejam tendo uma seguência de ações de certa forma premeditados. Não me parece obra do acaso, se falar em volume de recursos maiores de várias cidades do país, ou mesmo recursos mal aplicados, além de se divulgar com fotos, e isso de forma tacanha, alunos com roupas de grife e/ou com seus carros do ano, etc…
Bem, de qualquer forma acho interessante sempre estarmos vigilantes, e lembrar do texto do prof. Mario Maestri, doutor em Ciências Históricas pela UCL, Bélgica, lembrando sobre o surgimento das universidades na Idade Média, onde ele diz: “Na Idade Média, era uma enorme conquista quando uma cidade obtinha uma universidade. Comumente, com ela, vinha o direito a uma ampla autonomia quando à autocracia do príncipe. Tratava-se de liberdade considerada indispensável para o novo templo do saber. Devido a isso, o campus universitário medieval possuía sua polícia própria e julgava seus alunos, funcionários, professores”.
Um abraço.

Valdir, - 11-11-’11 16:56
Leonardo Motta

Não sei se a Polícia das universidades norte-americanas são “especialmente treinadas”. A distinção eu acho que é uma questão de jurisdição apenas, o treinamento, eu acho, é o mesmo.

Eu posso falar que em Dartmouth College quem faz a segurança local é a polícia regular, que tem jurisdição em toda cidade, incluindo o campus. Além da polícia regular, a universidade tem sua própria segurança privada. Pelo menos em Dartmouth, as duas funcionam em cooperação. A polícia não tem as chaves dos prédios, por exemplo, mas a Segurança tem. Mas nos EUA, a Polícia pode invadir o campus universitário sem mandato se existe evidência grave de perigo. Por exemplo, se um aluno entra em uma sala e começa a atirar e uma viatura escutar o ataque, ela pode sim, invadir até mesmo o prédio privado da universidade para proteger a vida das pessoas.

O mesmo era verdade em Yale. Lá quem faz policiamento dentro do campus é a State Police além da Yale Security. Yale deve ser uma das universidades com pior indice de violência da Ivy League, e lá há uma preocupação muito grande com a segurança dos alunos, que é feita de forma relativamente pesada com polícia. Quando eu ia pegar a van para o aeroporto no portão principal de noite ou de madrugada, sempre tinha três carros de polícia (não da Segurança) no portão principal para garantir a segurança.

A segurança privada ajuda. Mas a polícia é fundamental. A segurança, ou a Guarda Universitária da USP, não podem dar voz de prisão. Elas são úteis apenas em casos menores. Em casos graves, como assaltos a mão armada, homícido, seqüestro relâmpago, etc., a polícia é quem tem condições de agir.

Leonardo Motta, - 11-11-’11 17:33
Paulo Kuchembuck

Prof. Suaide, a analogia direta entre PM para Oficiais e PC para Detetives é um equívoco. A diferenciação entre policiais militares e civís não está apenas nas funções ostensiva e de investigação. Ela é mais profunda. A PM é efetivamente militar. Ela tem função ostensiva de segurança pública em paralelo à função do Exército em segurança nacional. Função que, em grande medida, é de retaliação. Nos EUA, a polícia é inteiramente civil.

Mesmo que a atual PM não traga em si o ranso ideológico dos tempos de chumbo, sua estrutura é baseada em modelos militaristas que, em dada medida, são responsáveis pelo seu padrão repressor. Por isso, e no caso do movimento em adamento na USP, não vejo possibilidade da PM prestar segurança em qualquer universidade. As universidades são espaços livres, e assim devem permanecer. Patrulhamento ostensivo para retaliação não é solução.

Concordo que deveríamos ter um corpo policial preparado para segurança pública e universitária em específico, mas por princípio isso é impossível com a PM. A PM, como instituição, é incompatível com a demanda de segurança em um ambiente libertário.

Paulo Kuchembuck, - 11-11-’11 19:20
Alexandre Suaide

@Pedro, tem o botão de curtir, que acredito faz isso. Mas vou investigar a possibilidade de colocar um botão de compartilhar.

@Valdir, obrigado. Sem dúvida há muito mais coisas nos bastidores e que esses acontecimentos constituem apenas o cenário do momento. É fácil perceber, por exemplo, entre os dois maiores jornais de São Paulo, grandes diferenças nas linhas de pensamento em relação à USP. A imprensa é livre mas não é imparcial. Isso em qualquer lugar do mundo.

@Leandro, você tem razão, em parte. Cada lugar tem sua política distinta. Depende de muitos fatores. Yale (já estive lá), por exemplo, é uma ilha de fartura em um mar de pobreza (talvez um pouco exagerado, mas mesmo assim). É bem diferente de Berkeley (onde também já estive). Cada um resolve o ser problema da melhor forma. Mas em todos lugares onde já estive (e não foram poucos) a polícia é parte fundamental do esquema de segurança.

@Paulo, eu sei que há diferenças conceituais mais profundas entre as duas polícias. Mas acontece que no exterior, a polícia militar raramente é usada no policiamento do dia a dia, servindo apenas em situações de crise e a analogia que eu fiz é o que, de fato, o João e Maria da esquina percebem em relação ao nosso modelo de policiamento. A PM é o policial comum, preventivo e ostensivo, enquanto a polícia civil e o policial investigativo. Eu não disse que a PM é M só no nome.

Alexandre Suaide, - 11-11-’11 20:24
Cinthia

Sou aluna da FFLCH e achei interessantíssimo o seu ponto de vista… Também concordo que independente de como esteja a PM hoje ainda é ela quem pode, na pior das hipóteses, garantir nossa segurança… Nessas questões o que vejo é a intolerância ou intrasigência, que impera entre esses dois grupos (Estudantes X PM)… E isso impede o diálogo, que ao meu ver, ainda é a melhor arma… participei de algumas discussões, li vários textos que expressavam a opinião de quem disse ter presenciado todos os atos (eu particularmente só presenciei o da abordagem dos três alunos com maconha)… habito o ambiente ao qual nasceu todos esses protestos… Mas não aprovo as ocupações, como também não desejo que a PM saia do Campus… O que espero sim é que haja mais diálogo de ambos os lados para que seja vencido o preconceito e a política de ódio que está sendo instaurada perante tanto tumulto.

Mais uma vez, excelente ponto de vista! E tenha certeza, apesar de não parecer muitas pessoas de dentro da FFLCH possuem discursos semelhantes ao seu, mas apenas não tem espaço para expressá-lo!

Cinthia, - 11-11-’11 20:57
Bruno

Sou aluno do Bach. em Física e não conhecia estes dados sobre outras Universidades, foi um texto muito esclarecedor, o que tem sido raro sobre o atual tema “PM na USP”. É muito importante para nós, alunos, que haja professores que divulguem sua opinião, pois o que mais se tem visto é o famoso “voltamos a ditadura”, sem argumentos mais desenvolvidos, ou o silêncio.

Infelizmente, ao meu ver, o caminho do diálogo, mesmo neste tempo de democracia, está sendo deixado de lado na USP pelos próprios alunos. Existem inúmeros relatos de agressões e fechamento de prédios, de legalidade duvidosa, que estão acontecendo este mês. Sei que na Física isto há muito não acontece, porém é triste presenciar o mesmo em outros institutos. Deste modo, considero muito importante a divulgação de opiniões pacíficas que apresentem possíveis soluções, principalmente de professores, os quais normalmente tomamos como referência. Pessoalmente, concordo com este texto, e o divulgarei para amigos.

Bruno, - 11-11-’11 23:37
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