Radioatividade

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Notas de aula são propriedade intelectual. Sendo assim, qualquer uso, no todo ou em parte, deve ter a origem referenciada apropriadamente, após autorização de seu autor.

O texto a seguir corresponde à anotações parciais de aula. Não é um texto em forma final, completo e totalmente revisado. Nesse caso, esse texto não tem como objetivo substituir livros sobre o assunto. Assim, esse texto deve ser entendido apenas como um guia de estudo para o aluno acompanhar a disciplina.


A radioatividade consiste em um fenômeno no qual núcleos perdem energia, tornando-se mais estáveis, seja por emissão de radiação ou partículas. Esse fenômeno pode ser natural ou artifical, dependendo de como os núcleos são gerados. O estudo da radioatividade teve início em 1896 quando Henri Becquerel, cientista francês, estudava materiais fosforescentes. Ele percebeu que alguns materiais que não possuiam fosforescência eram capazes de velar chapas fotográficas no escuro. Um dos materiais utilizado foi sal de urânio. Como as chapas fotográficas estavam embrulhadas em papel, a radiação que velava as placas deveria ser capaz de penetrar papel grosso. Trabalhos posteriores de Marie e Pierre Curie, mostraram que essa radiação poderia ser muito mais complexa que aquelas descobertas por Röntgen (raios-X) e deveriam ter outra origem. Muito mais tarde, Rutherford descobriu o núcleo atômico. Ao longo desse processo descobriu-se muitos outros materiais que emitiam esse tipo de radiação. Deve-se prestar atenção aos trabalhos sistemáticos conduzidos por Marie Curie, que concederam a ela dois Prêmios Nobel, um em Física, pela descoberta da radioatividade (junto com Pierre Curie e Antoine Henri Becquerel), em 1903, e outro em Química, pela descoberta do rádio e polônio, em 1911, ano da descoberta do núcleo atômico. Foi a primeira pessoa a receber dois Prêmios Nobel.

Os principiais tipos de radiação de origem nuclear são emissão de partículas α e β e emissão de radiação eletromagnética de alta energia, ou raios-γ. A emissão de radiação por um núcleo é um processo estatístico. A taxa temporal (\lambda), também chamada de constante de decaimento, na qual núcleos emitem radiação é característico de cada núcleo e depende do tipo de radiação emitida. O número de núcleos que decaem (dn) em um intervalo de tempo dt depende do número de núcleos presentes na amostra (N) e vale:

dn = -\lambda N dt             (1)

O sinal negativo indica que o número de núcleos na amostra deve diminuir com o tempo. Integrando (1) temos:

N = N_0 e^{-\lambda t}             (2)

Onde N_0 é o número de núcleos na amostra no instante 0. Note que, devido às características de uma função exponencial, o tempo 0 é totalmente arbitrário. Dois conceitos importantes, que caracterizam uma amostra radioativa, é a meia-vida e vida-média. Essas grandezas são correlacionadas, contudo com pequenas diferenças nas suas definições. A meia-vida (\tau_{1/2}) de uma amostra é o tempo necessário para reduzir pela metade o número de núcleos naquela amostra. Desse modo:

N(\tau_{1/2}) = \frac{N_0}{2} \rightarrow \tau_{1/2} = \frac{\ln{2}}{\lambda}             (3)

Por outro lado, a vida-média (\tau) de uma amostra é tal que o número de núcleos presentes na amostra é reduzido em 1/e. Assim:

N(\tau) = \frac{N_0}{e} \rightarrow \tau = \frac{1}{\lambda}             (4)

A relação (2) indica o número de núcleos presentes em uma amostra radioativa. Define-se a atividade de uma amostra como sendo o número de decaimentos por unidade de tempo. Desse modo:

A = -\frac{dN}{dt} = N_0 \lambda e^{-\lambda t} = A_0 e^{-\lambda t}             (5)

O sinal negativo indica que a atividade é positiva pois o número de núcleos na amostra diminui. Note que a atividade possui expressão similar àquela obtida para o número de núcleos em uma amostra. A atividade de uma amostra é relativamente simples de medir. Por exemplo, se o decaimento da amostra for por emissão γ, um simples contador Geiger é capaz de determinar sua atividade. A unidade mais comum para atividade de uma amostra é o Curie (Ci), onde 1 Ci = 3.7 x 1010 desintegrações por segundo. Costuma-se também utilizar o becquerel (Bq), sendo 1 Bq = 1 desintegração por segundo. Temos também o rutherford (Rd), sendo 1 Rd = 106 desintegrações por segundo. Hoje em dia sabe-se que o dano causado pela radiação não depende apenas da sua atividade. Depende também do tipo de radiação e do tecido biológico que foi exposto a essa radiação. Nesse caso, grandezas diversas, como exposição, dose e dose absorvida foram criadas ao longo dos anos como forma de contabilizar de modo mais preciso os efeitos causados pela radiação.

Figura 1 - Decaimento múltiplo.

Muitos núcleos na Natureza decaem por emissão de mais de um tipo de radiação. Um exemplo é o núcleo de 212Bi (figura 1). Esse núcleo pode decair por emissão β ou por emissão α. Cada um desses modos possui uma constante de decaimento característica, \lambda_1 e \lambda_2. Como o decaimento é probabilístico, devemos combinar cada uma desses decaimentos no cálculo da constante de decaimento total do núcleo. Havendo uma amostra na qual o núcleo que a compõe possa decair através de n modos distintos, cada um com sua constante de decaimento, \lambda_1, \lambda_2,...,\lambda_n o número de núcleos que decaem em um intervalo de tempo, similar à expressão (1) pode ser dado por:

dn = -\lambda_1 N dt - \lambda_2 N dt - ... -\lambda_n N dt = -(\lambda_1 + \lambda_2 + ... + \lambda_n)N dt             (6)

É fácil ver que a constante de decaimento total de um núcleo com múltiplos decaimentos é:

\lambda = \lambda_1 + \lambda_2 + ... + \lambda_n             (7)

A probabilidade na qual o decaimento i, com constante de decaimento \lambda_i é facilmente calculada a partir de (6) e vale:

p_i = \frac{\lambda_i}{\lambda}             (8)

Essa probabilidade é chamada, em Inglês, de Branching ratio. Em Português, costuma-se utilizar fração de ramificação.

Outra situação interessante e bastante comum é o decaimento sequencial de elementos radioativos. O decaimento sequencial é aquele no qual o núcleo 1 decai em um núcleo 2, com constante de decaimento \lambda_1. O núcleo 2, por conseguinte, decai no núcleo 3 com constante de decaimento \lambda_2 e assim sucessivamente até o núcleo n, estável, ou seja:

N_1 \xrightarrow{\lambda_1} N_2 \xrightarrow{\lambda_2}N_3 \xrightarrow{\lambda_3} ... \xrightarrow{\lambda_{n-1}}N_n

Seja um núcleo i nessa cadeia. A variação no número desse núcleo na amostra cresce por conta do decaimento do núcleo i-1 e decresce por conta do seu próprio decaimento. Assim, a taxa de variação de sua quantidade na amostra pode ser escrita de forma similar à (1) como:

\frac{dN_i}{dt} = N_{i-1}\lambda_{i-1} - N_i \lambda_i             (9)

Em uma cadeia de decaimento composta por n núcleos pode-se escrever n equações similares à (9) e assim calcular, em qualquer instante de tempo, a quantidade de cada tipo de núcleo nessa amostra, bastando conhecer o número de núcleos iniciais. Um exemplo que demonstra bem o comportamento temporal das concentrações de núcleos em uma amostra pode ser feito supondo um decaimento sequencial em duas etapas. O núcleo 1 decai no núcleo 2, que decai no núcleo 3, esse estável. Supondo que no início, a amostra é composta apenas pelo núcleo 1, pode-se concluir que:

  1. Na medida em que o núcleo 1 decai, o número de núcleos 2 começa a aumentar.
  2. O núcleo 2 começa a decair, surgindo o núcleo 3.
  3. Há uma competição entre formação e decaimento do núcleo 2. É natural pensar se o número de núcleos 1 for muito maior que o número de núcleos 2, a competição é ganha pela formação do núcleo 2.
  4. A partir de um determinado momento, o número de núcleos 1 torna-se pequeno e não consegue compensar o decaimento do núcleo 2. Assim o número de núcleos 2 na amostra volta a cair. Há um instante de tempo no qual o número de núcleos 2 na amostra é máximo.

Formalmente, podemos escrever que:

\frac{dN_1}{dt} = -N_{1}\lambda_{1}           (10)

\frac{dN_2}{dt} = N_{1}\lambda_{1}-N_{2}\lambda_2           (11)

A resolução de (10) é trivial, resultando em:

N_1 = N_{1}^0e^{-\lambda_{1}t}           (12)

Podemos resolver (11) supondo uma solução do tipo:

N_2 = Ae^{-\lambda_{1}t}+Be^{-\lambda_{2}t}           (13)

Supondo que no instante t=0 não exista núcleos do tipo 2 na amostra, ou seja, N_2^0 = 0, é fácil ver que A=-B. No instante inicial, temos portanto que:

\frac{dN_2}{dt}(0) = N_{1}^0\lambda_{1} \rightarrow -\lambda_1 A + \lambda_2 A = N_{1}^0\lambda_{1}           (14)

O que resulta em:

N_2 = \frac{\lambda_1}{\lambda_2-\lambda_1}N_1^0\left(e^{-\lambda_{1}t}-e^{-\lambda_{2}t}\right)           (15)

Um exemplo dessa competição pode ser visto na figura 2. Há várias cadeias de decaimento na Natureza. Podemos citar, por exemplo, a série radioativa do 238U que termina no 206Pb. Um esquema dessa série é mostrado na figura 3.

Figura 2 - Decaimento sequencial em dois passos.

Figura 3 - Série radioativa do 238U.

As relações mostradas acima são puramente probabilísticas. Essas são respeitadas quando estudamos amostras com quantidades muito grande de núcleos. Por conta de flutuações estatísticas, amostras com número reduzido de núcleos podem apresentar grandes desvios dessas relações. Contudo, há uma correlação muito grande entre essas relações com as características microscópicas dos núcleos que compõem uma determinada amostra. Essa correlação se faz através da constante de decaimento da amostra. Como essa constante se relaciona com as características do estado de energia no qual o núcleo que vai decair se encontra? O que define a probabilidade de um núcleo decair em outra, em termos de função de onda, potencial de interação, estrutura nuclear, etc.? Como podemos estudar o decaimento microscopicamente? Exploraremos isso nas próximas aulas, inicialmente estabelecendo correlações entre constantes de decaimento com energia e probabilidades de transição. Em seguida estudaremos individualmente os decaimentos α, β e γ.

Exercícios

  1. Mostre (8) a partir de (6)
  2. O 210Bi decai por emissão β (vida média de 7,2 dias) no 210Po. Esse decai por emissão α (vida média de 200 dias) no 206Pb. Supondo que a amostra contenha inicialmente apenas 210Bi, faça um gráfico com a fração relativa de cada um desses núcleos em função do tempo. Qual é o instante de tempo que a atividade dessa amostra por emissão α é máxima?
  3. As teorias de grande unificação predizem que o próton não é estável, porém com vida meia-vida da ordem de 1033 anos. Qual é a atividade esperada para decaimento de prótons de uma amostra de 1000 toneladas de água?

Leitura recomendada

  1. Introductory Nuclear Physics, K. S. Krane, capítulo 6.
  2. Introdução à Física Nuclear, H. Schechter e C. A. Bertulani, capítulos 5.
  3. Nuclear and Prticle Physics, W. S. C. Williams, capítulo 2.
Alexandre Tuesday 04 May 2010 at 1:53 pm | | FisicaNuclear

two comments

Andrezza

Olá professor

Gostaria de confirmar se no exercício 2 é para fazer um gráfico começando com 206Bi ou 210Bi.

Atenciosamente

Andrezza Cacione

Andrezza, (Email ) - 27-05-’10 16:05
Alexandre

Olá Andrezza, já corrigi o enunciado. Obrigado!

Alexandre, - 27-05-’10 16:27
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