Modelo de camadas - alguns potenciais

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Notas de aula são propriedade intelectual. Sendo assim, qualquer uso, no todo ou em parte, deve ter a origem referenciada apropriadamente, após autorização de seu autor.

O texto a seguir corresponde à anotações parciais de aula. Não é um texto em forma final, completo e totalmente revisado. Nesse caso, esse texto não tem como objetivo substituir livros sobre o assunto. Assim, esse texto deve ser entendido apenas como um guia de estudo para o aluno acompanhar a disciplina.


Vamos considerar alguns potenciais radiais simples para tentar obter o espectro de níveis de energia de um núcleo atômico. O potencial mais simples que podemos utilizar é o poço quadrado infinito. Esse poço é por demais simplificado. Podemos pensar, por exemplo, que o poço infinito não permite escape de nucleons do núcleo, impedindo, por exemplo, decaimento nuclear por partículas α. Na verdade, deveríamos começar com o poço retangular finito. Contudo, para \ell \ne 0 as soluções são apenas numéricas. A diferença principal entre o poço finito e infinito surge nas condições de contorno. Enquanto que, para o poço infinito, a função de onda deve assumir o valor zero na borda do poço, no finito há uma pequena penetração além da sua fronteira. Essa pequena diferença altera levemente a distribuição de níveis de energia, principalmente em níveis próximos da energia zero. Contudo, qualitativamente, os resultados obtidos com o poço infinito permitem exemplificar de forma satisfatória algumas características observadas no núcleo.

Seja então um poço infinito de largura radial R. Acima desse valor o potencial é infinito enquanto que, abaixo desse valor, o potencial é nulo. Isso é muito similar ao modelo de gás de Fermi. Contudo, nessa situação, trataremos o problema com a simetria esférica apropriada, de onde surgirá a dependência dos níveis de energia com o momento angular orbital correspondente.

A equação para a parte radial da função de onda para esse potencial, no interior do poço, pode ser escrita como:

\frac{d^2}{dr^2}u_{n\ell} + \frac{2m}{\hbar^2}\left( E_{n\ell} -\frac{\hbar^2}{2m}\frac{\ell(\ell+1)}{r^2} \right) u_{n\ell} = 0             (1)

As soluções de (1) são proporcionais às funções de Bessel esféricas:

u_{n\ell}(r) \propto r  j_\ell(k_{n\ell}r)             (2)

onde:

k_{n\ell} = \sqrt{\frac{2mE_{n\ell}}{\hbar^2}}             (3)

A quantização de energia, nesse caso, surge da aplicação das condições de contorno em r=R, o raio do potencial. Nesse caso, u_{n\ell}(R) = 0. Assim, temos que, para cada valor de \ell devemos respeitar que:

k_{n\ell}R = z_{n\ell}             (4)

onde z_{n\ell} corresponde ao n-ésimo zero da função de Bessel esférica de órdem \ell. A tabela 1 mostra os primeiros zeros de funções de Bessel esféricas para vários valores de momento angular orbital.

Tabela 1 - Alguns zeros de funções de Bessel esféricas.
  n=1     n=2     n=3     n=4    
\ell=0     3.142 6.283 9.425 12.566
\ell=1     4.493 7.725 10.904 14.066
\ell=2     5.763 9.095 12.323 15.515
\ell=3     6.988 10.417 13.698 16.924
\ell=4     8.183 11.705 15.040 18.301


Substituindo (3) em (4), chegamos, finalmente à:

E_{n\ell} = \frac{\hbar^2}{2m}\left(\frac{z_{n\ell}}{R}\right)^2             (5)

A figura 1 mostra o esquema de níveis de energia obtidos com o poço quadrado infinito. Do lado esquerdo é mostrado o n-ésimo zero e momento angular correspondentes àquele nível. Do lado direito é mostrado o número de prótons (ou nêutrons) que poderiam ocupar esse nível, dado por 2(2\ell+1), sendo o primeiro fator 2 devido à degenerescência de spin. Note que, nesse modelo, não há degenerescência de estados senão aquelas devido à projeção de spin e momento angular orbital, ou seja, não há níveis de mesma energia e \ell diferentes, por exemplo.
Figura 1 - Níveis de energia de um poço quadrado infinito.

Os números mágicos podem ser calculados considerando, por exemplo, quando há duas camadas relativamente distantes se comparada às demais. Na figura 1 podemos dizer que isso ocorre entre as camadas 1-2, 2-3, 4-5, 5-6, 7-8, etc. resultando nos seguintes números mágicos:

  • 2
  • 2 + 6 = 8
  • 8 + 10 + 2 = 20
  • 20 + 14 = 34
  • 34 + 6 + 18 = 58, etc.
Note que os três primeiros números mágicos são compatíveis com os observados. Contudo, essa compatibilidade desaparece rapidamente. Note que não nos preocupamos, por enquanto, com a compatibilidade entre a sequência de estados de momento angular observadas com aquelas previstas pelo modelo.

Uma segunda opção para o potencial de interação, também simples e com resolução analítica, é o potencial de oscilador harmônico radial, ou seja, aquele no qual o potencial é dado por:

V(r) = \frac{1}{2}m\omega^2r^2             (6)

Assim, a equação radial torna-se:

\frac{d^2}{dr^2}u_{n\ell} + \frac{2m}{\hbar^2}\left( E_{n\ell} -\frac{1}{2}m\omega^2r^2 -\frac{\hbar^2}{2m}\frac{\ell(\ell+1)}{r^2} \right) u_{n\ell} = 0             (7)

A resolução de (7) não vem ao caso nesse momento. A componente radial dos autoestados para esse potencial possui uma forma complexa, composta de exponenciais decrescrentes (que limitam a penetração da função de onda para o interior da barreira de potencial) e polinômios de Laguerre, na forma:

u_{n\ell} \sim e^{-(m\omega^2r^2)/2\hbar}r^{\ell+1}L_{n+\ell-1/2}^{\ell+1/2}\left( \sqrt{\frac{m\omega}{\hbar}r\right)             (8)

Os autovalores, contudo, assumem uma forma simplificada, similar ao oscilador harmônico simples:

E_{n\ell} = \hbar\omega\left(2n+\ell-\frac{1}{2}\right)             (9)

Sendo n e \ell números inteiros positivos, pode-se notar que pode haver diferentes combinações de n e \ell que resultam no mesmo nível de energia. Desse modo, o potencial de oscilador harmônico possui níveis de energia degenerados nesses dois números quânticos. Vamos tentar calcular essa degenerescência de modo a obter os números mágicos fornecidos por esse potencial.

Primeiramente, para simplificar, vamos fazer uma mudança de variável:

\Lambda = 2n+\ell-2             (10)

que, substituindo em (9), resulta em:

E_{n\ell} = \hbar\omega\left(\Lambda + \frac{3}{2}\right)             (11)

\Lambda pode, segundo (10), assumir qualquer valor inteiro maior ou igual a zero. Nota-se, assim, que o nível de energia mais baixo para o oscilador harmônico, como esperado, não possui energia nula. Precisamos agora contar quantas combinações de n e \ell podemos construir para cada estado \Lambda. Devemos dividir essa contagem em duas categorias: \Lambda (ou \ell) sendo par ou \Lambda (ou \ell) sendo ímpar. Para \Lambda par podemos escrever:

\Lambda = (\ell,n) = \left(0,\frac{\Lambda+2}{2}\right), \left(2,\frac{\Lambda}{2}\right),...,\left(\Lambda,1\right)             (12)

Para \Lambda ímpar:

\Lambda = (\ell,n) = \left(1,\frac{\Lambda+1}{2}\right), \left(3,\frac{\Lambda-1}{2}\right),...,\left(\Lambda,1\right)             (13)

Figura 2 - Níveis de energia de um oscilador harmônico infinito.

Pode-se notar, também, que a degenerescência em energia não mistura estados de paridade diferente. Cada estado possui paridade bem definida. Na figura 2 podemos ver os níveis de energia de um oscilador harmônico radial. Nesse caso, os números mágicos, como não há nenhuma concentração evidente de níveis, são:

  • 2
  • 2 + 6 = 8
  • 8 + 12 = 20
  • 20 + 20 = 40
  • 40 + 30 = 70, etc.
Novamente podemos notar que apenas alguns números mágicos são reproduzidos. Comparando os números mágicos do poço infinito e oscilador harmônico com os números mágicos observados de fato no núcleo (2, 8,20, 28, 50, 82, 126) notamos que uma solução intermediária entre o oscilador harmônico e o poço infinito deve se aproximar um pouco melhor dos números mágicos experimentais. Devemos também levar em conta que o potencial de interação deve ser finito, ou seja, deve haver a possibilidade de um nucleon se desprender do núcleo, como observado normalmente.

Uma forma intermediária é o potencial de Woods-Saxon (figura 3). Esse potencial é dado pela expressão:

V(r)=\frac{-V_0}{1+e^{(r-R)/a}}             (14)

Figura 3 - Potencial de Woods-Saxon.

Além de ser uma forma intermediária entre o poço quadrado e o oscilador harmônico, o potencial de Woods-Saxon representa também a distribuição de carga e massa nuclear, como vimos anteriormente. A troca de sinal se dá apenas por conta da força nuclear ser atrativa. Como a interação nucleon-nucleon é de curto alcance, esse potencial se torna bastante interessante na descrição da interação média entre os nucleons no núcleo. Contudo, encontrar os nívies de energia e auto-estados desse potencial não é uma tarefa simples. Normalmente utilizam-se procedimentos numéricos diversos para resolver esse potencial. A figura 4 mostra os níveis de energia obtidos com um potencial de Woods-Saxon, como o mostrado na figura 3.
Figura 4 - Níveis de energia de um potencial de Woods-Saxon.

Os números mágicos obtidos com esse potencial são:

  • 2
  • 2 + 6 = 8
  • 8 + 10 + 2 = 20
  • 20 + 14 + 6 = 40
  • 40 + 18 = 58, etc.
Que também não reproduzem a contento as observações experimentais. Na tabela 2 resumimos os valores obtidos com os três potenciais descritos nesse texto.

Tabela 2 - Números mágicos.
Exp.  
Poço infinito  
Oscilador  
Woods-Saxon
2
2
2
2
8
8
8
8
20
20
20
20
28
34
40
40
50
58
70
58
82
 
92
92

Os valores na tabela 2 indicam claramente que os potenciais utilizados para descrever a interação média dos nucleons no núcleo não são capazes de reproduzir os números mágicos observados. Quase duas décadas depois, nos anos de 1940-1950 era claro que potenciais puramente centrais não eram capazes de reproduzir esses números mágicos. Uma mudança crucial ocorreu em 1949 com o surgimento de correções devido a interações spin-órbita. Veremos isso a seguir.

Exercícios

  1. As energias de ligação dos núcleos 15O, 16O e 17O são, respectivamente, 111.95 MeV, 127.62 MeV e 131.76 MeV. Deduza as energias do último estado ocupado e do primeiro estado não ocupado do 16O.
  2. Usando os potenciais discutidos aqui, preveja os valores possíveis de J^\pi dos estados fundamentais dos núcleos: 27Mg e 87Sr. Compare com os valores observados \tfrac{1}{2}^+ e \tfrac{9}{2}^+

Leitura recomendada

  1. Introductory Nuclear Physics, K. S. Krane, capítulo 5.
  2. Introduction to Nuclear and Particle Physics, A. Das e T. Ferbel, capítulo 3.
  3. Introdução à Física Nuclear, H. Schechter e C. A. Bertulani, capítulos 4.4.
  4. Nuclear and Prticle Physics, W. S. C. Williams, capítulo 8.
Alexandre Thursday 22 April 2010 at 10:52 pm | | FisicaNuclear

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